Panorama epidemiológico do Adenovírus, Astrovírus e Reovírus aviário em plantéis de aves no Brasil
- Vinícius Borges e Camila Costa
- há 5 dias
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Baseado no artigo original publicado em Poultry Science (2025), de Faria et al., através de uma parceria de sucesso entre Inata Biológicos e Universidade Federal de Uberlândia, disponível em: https://doi.org/10.1016/j.psj.2025.104964.
A avicultura industrial brasileira tem enfrentado desafios crescentes relacionados à emergência e reemergência de enfermidades virais, cuja complexidade clínica e impacto econômico demandam respostas cada vez mais precisas e integradas. Dentre os agentes virais de maior relevância nos últimos anos, destacam-se o Adenovírus Aviário (FAdV), o Astrovírus Aviário (CAstV) e o Reovírus Aviário (ARV), todos com reconhecido potencial patogênico e ainda pouco explorados do ponto de vista epidemiológico em sistemas comerciais nacionais.
Estes agentes virais, apesar da importância para a avicultura nacional, ainda possuem poucos estudos que abranjam a sua epidemiologia nas granjas comerciais brasileiras, então com o objetivo de compreender a prevalência, a distribuição geográfica e o impacto clínico desses vírus, foi conduzido o maior estudo epidemiológico já realizado no Brasil sobre o tema. A investigação abrangeu quase dois mil lotes de aves comerciais, totalizando 4.568 análises laboratoriais realizadas entre os anos de 2021 e 2024, com base em dados clínicos de campo e exames laboratoriais especializados.
O Adenovírus Aviário é um vírus de DNA com capacidade de transmissão vertical e horizontal, frequentemente associado a quadros de hepatite com corpos de inclusão, erosão de moela e à síndrome da refugagem (Runting-Stunting Syndrome), responsável por desuniformidade de crescimento. O Astrovírus Aviário, por sua vez, é um vírus RNA transmitido principalmente por via fecal-oral e vertical, relacionado à síndrome do pinto branco, enterites, gota visceral e mortalidade precoce em pintos. E completando a tríade que foi abordada neste estudo, temos o Reovírus Aviário que é um vírus RNA de dupla fita, não envelopado, com tropismo para tecidos conjuntivos e intestinais. Estando, associado a quadros de tenossinovite, artrite viral, hidropericárdio, imunossupressão e alterações respiratórias e digestivas, mesmo em infecções com baixa mortalidade aparente.
Para a execução do estudo, foram avaliadas aves comerciais de linhagens leves e pesadas oriundas de 13 estados brasileiros, selecionadas por apresentarem sinais clínicos sugestivos de infecção por FAdV, CAstV ou ARV. Após necropsia, amostras de tecidos como intestino, fígado, coração, baço, moela e tendões foram submetidas a isolamento viral, RT-qPCR e sequenciamento genético, utilizando protocolos específicos para cada agente, com emprego de ovos embrionados SPF ou cultivo celular.
E o que encontramos?
Os resultados laboratoriais revelaram que 25,5% dos lotes com sinais clínicos testaram positivos para pelo menos um dos vírus investigados. O ARV foi o agente mais frequentemente detectado, com 15,2% dos casos, seguido por CAstV com 9,9% e FAdV com 4,8%. As infecções isoladas foram mais prevalentes do que as infecções mistas. Em termos regionais, o estado de Goiás apresentou alta positividade para os três vírus. O FAdV teve maior incidência em Santa Catarina e Paraná, enquanto o CAstV foi mais frequente no Rio Grande do Sul. O ARV apresentou maior prevalência no Distrito Federal, Mato Grosso do Sul e novamente no Paraná. Estes dados evidenciam uma ampla circulação viral em território nacional, com variações significativas entre regiões.

A análise dos tecidos de isolamento mostrou que a maioria dos isolados de FAdV (79,7%) e CAstV (78,2%) foi obtida a partir do intestino, confirmando seu tropismo entérico. Em menor proporção, foram também isolados do fígado, coração e baço. O ARV, por sua vez, foi isolado principalmente do intestino (58,6%) e dos tendões (48%), reforçando sua afinidade por tecidos articulares e conjuntivos. Esses achados reforçam a importância da seleção criteriosa do tecido amostral para diagnósticos laboratoriais precisos.
O presente estudo permitiu não apenas mapear a presença dos vírus FAdV, CAstV e ARV em aves comerciais brasileiras, mas também correlacionar a ocorrência desses patógenos com faixas etárias, manifestações clínicas, padrões zootécnicos e gravidade das lesões, além explora a vulnerabilidade imunológica das aves jovens e o papel da transmissão vertical. Verificou-se que as coinfecções, sobretudo entre ARV e os demais agentes, estiveram associadas a quadros clínicos mais severos e zootecnicamente prejudiciais, como desuniformidade e aumento da mortalidade.

Entre os isolados de adenovírus aviário obtidos em 2023, destacou-se a prevalência, do Aviadenovirus E (hepatitidis), sorotipos 8a e 8b, seguido pelo Aviadenovirus B (quintum), sorotipo 5 e Aviadenovirus A (ventriculi), sorotipo 1, todos reconhecidamente associados a hepatite com corpos de inclusão, erosões de moela e distúrbios sistêmicos de alta morbidade. Estes resultados corroboram a patogenicidade diferenciada entre os sorotipos circulantes e reforçam a necessidade de caracterização molecular contínua para embasar estratégias vacinais assertivas.
Quanto ao Reovírus aviário, a tipagem genética de 135 isolados revelou uma ampla diversidade filogenética, distribuída entre seis clusters distintos, com destaque para o cluster 5, que representou 38,4% dos casos, seguido dos clusters 2 e 6, com prevalência de 20,8% e 15,2%, respectivamente. A elevada presença destes grupos genéticos podem estar associadas à maior capacidade de adaptação viral e à disseminação em campo, sendo fundamental monitorar sua evolução em cada região, seja a região, considerada em âmbito nacional, estadual, integração ou granja específica. Este achado, reforça a importância de integrar o diagnóstico molecular de alta resolução aos programas de vigilância, visando não apenas detectar, mas compreender o comportamento dinâmico das variantes virais que impactam diretamente a saúde das aves e os indicadores de desempenho produtivo.
Este trabalho representa um marco relevante para a sanidade avícola nacional, fornecendo uma visão abrangente e tecnicamente embasada sobre a circulação desses vírus em escala industrial. A ampla ocorrência e os efeitos deletérios destes agentes sobre a produtividade evidenciam a urgência da implantação de programas de vigilância, melhoria da biosseguridade e avaliação vacinal específica.
Por fim, convidamos os profissionais da indústria avícola e público em geral, a consultarem o artigo original e colocamo-nos à disposição, através de nossa equipe técnica, para discussões personalizadas e apoio na aplicação prática destes resultados em campo.
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